terça-feira, 18 de maio de 2010

Territorialismo


As mulheres são seres territorialistas.
Saem a marcar nossas vidas com registros físicos e outros além disso.
Saem a espalhar, por nossas casas, camas, carros e outros lugares, fios de cabelos, anéis, pulseiras, brincos, piercings, batons, brilhos, roupas e fotos.
Com isso parecem estar a demarcar um território.
O tempo passa e às vezes nos deparamos com uma dessas lembranças físicas deixadas, quase que por engano, em algum canto de nosso caminho.
E daí, quando nos deparamos com esse registro, é que volta à tona a marca ainda mais difícil de ser apagada.
Essa é aquela que não está em um objeto, mas que é tatuagem cravada na própria alma.
E um simples objeto é sim capaz de despertar lembranças.
Por um momento, ainda que efêmero, a gente volta a viver tudo o que já viveu um dia.
E, dependendo da profundidade da marca, às vezes viajamos por mais tempo e muito mais distante do que uma efemeridade.
Mas quando a viagem acaba nos deparamos com a realidade.
O anel prateado ou o batom vermelho está ali brilhando na palma da mão.
A gente não deixa de sorrir.
Mas no instante seguinte guarda o objeto no fundo de uma gaveta.
Assim como aquela história, ele também está relegado apenas à lembrança.
E assim é trancado na gaveta do passado.

Vício


Sou repórter.
E não saberia ser outra coisa.
Ainda que eu não tenha nascido sabendo isso, depois que entrei no jornalismo descobri.
Sou viciado nas histórias alheias, em conversar com as pessoas, tentar apreender delas suas histórias, seus sentimentos e depois repassar isso, pingar gota a gota no papel aquela reportagem.
Ainda sinto frio na barriga quando saio para fazer uma pauta.
Ainda tenho o tesão do primeiro dia.
Ainda consigo me emocionar (é verdade) em ler textos antigos.
Às vezes até eu mesmo estranho e me pergunto: "mas fui eu mesmo quem fez?".
Eu amo o que eu faço.
É excitante garimpar a notícia...
Mergulhar a bateia profundamente no rio das histórias das pessoas e separar muita areia bruta, da qual é possível separar uma pedra preciosa: o ouro que é a notícia...
E nós repórteres somos sim garimpeiros...
Quem é repórter sabe o que estou dizendo.
Me chamem para ir a uma festa no meio da noite que às vezes eu posso pensar duas vezes.
Mas me digam que há uma boa história para ser contada em qualquer beira de esquina a qualquer hora da madrugada que eu deixo tudo e vou lá.
Sou assim.
E assim quero continuar sendo.
Repórter que se preza não deixa de ser repórter.
Ele respira e transpira isso 24 horas por dia.
Essa é a minha vida.
É a que escolhi.
Sou feliz.

domingo, 9 de maio de 2010

Vida e amor


Tem gente que possui a capacidade de se sentir acompanhado mesmo estando sozinho.
Tem gente que se sente só mesmo estando no meio de uma multidão.
A vida tem dessas coisas inexplicáveis.
A gente vive o tempo todo correndo atrás de respostas para chegar no final da estrada e descobrir que a própria vida é um livro que não podemos decifrar.
Perdemos tanto tempo tentando entender tanta coisa que acabamos esquecendo de viver.
E assim perdemos preciosos momentos na nossa caminhada.
Esse tal de amor...
Existirá ele de fato?
Ou será uma ilusão que criaram para nos tapear?
Como explicá-lo?
É um frio na barriga? Uma vontade insaciável de estar com alguém? Um desejo de entregar a própria vida para que a outra pessoa esteja bem?
Como é isso?
E se ele é tão importante e essencial, como é que acaba?
E daí como explicar a dor rasgada no peito, o aperto sufocante na garganta e os olhos que não param de arder?
Aliás, será possível explicar como é que ele começa?
Ele nasce inexplicavelmente e sem motivo assim como segue o mesmo caminho para morrer?
Simples assim?
Você amanhece não amando, entardece amando e amanhece no dia seguinte não mais amando?
Vai saber.
Tanta gente já escreveu sobre ele e para mim até hoje ninguém conseguiu explicar nada.
E quem é na vida que nunca sofreu por causa disso que se chama amor?
Quem é que nunca imaginou que não sobreviveria ao dia seguinte sem a presença de alguém?
Isso sem contar os que de fato não sobreviveram e decidiram colocar um ponto final, por conta própria, à amargura que lhes arranhava o peito e tirava a própria vontade de respirar.
Muito estranho.
Como é que algo pode ao mesmo tempo dar a sensação de bem e fazer tão mal.
Muitos se perdem pelo caminho por conta de um tropeço numa pedra (os especialistas preferem chamar de rocha) à qual se dá o nome de amor.
Muitos caem e não conseguem mais se levantar.
Felizes são aqueles que podem se agarrar a uma nova esperança e sair do abismo em que se atiraram ou foram atirados.
Felicidade efêmera.
Lá na frente estão eles novamente a se perder e a cair por conta do (bem ou mal) dito amor.
E assim a vida vai seguindo, de braços dados com esse tal de amor.
E o mundo humano gira em torno dele.
Seria ele o motivo da nossa vida?
Ou será ele que faz a nossa vida sem sentido?
Nem me arrisco a tentar entender.
Mas o fato é que nessa madrugada tão longa e vazia as perguntas me assaltam e me fazem perder o sono.
É tudo muito estranho.
É tão estranho estar na escuridão e precisar da luz e segui-la, mas ela sempre insistindo a se afastar ao nosso toque.
É tão estranho dormir ao lado da felicidade e ela simplesmente lhe afastar.
É impossível definir se isso é sonho ou pesadelo.
Tão perto de dormir num sonho e tão perto de acordar num pesadelo.