quarta-feira, 20 de junho de 2012

Crônica de uma morte anunciada



Em certo sentido, mulher, você ainda está por aí.
Não é sempre, mas as impressões são traiçoeiras.
Ecoam passos. A voz melodiosa sussurra pelo vazio da casa. O mesmo cheiro doce vez ou outra parece aparecer no ar. E a melodia de alguma música que nos marcou traz algum lampejo do que já fomos: o meu eu em você e o seu eu em mim.
Mas são apenas aquelas lembranças mais teimosas que me traem quando menos espero.
Sua presença física já se foi, há muito.
Não há mais rastros meus ou seus no caminho.
Já se sucederam incontáveis minutos, horas, dias, semanas e meses (talvez anos?) desde que nos distanciamos sem sequer justificar ou traduzir o real significado da palavra adeus.
Nem eu o fiz.
Nem você, tampouco.
Nada mais de fotos sorridentes ou pensativas, fios longos de cabelo espalhados e quaisquer objetos que remetam a você.
O tempo vai se encarregando de apagar os vestígios e atenuar os traços do desenho um dia riscado nas páginas da minha vida.
Foi assim com uma, com outra e com você mesma.
Tudo se foi.
Tudo passou.
As folhas foram caindo da árvore e acabaram sendo substituídas por outras folhas. Novas.
Antes as lembranças eram mais frequentes. Vinham minuto a minuto, dia a dia e agora não têm mais regularidade. Deixaram de ser crônicas.
E, pior ainda, suas lembranças passaram a se misturar com outras lembranças mais antigas e mais novas.
Assim, hoje, quando ouço passos ecoarem, vozes sussurrarem, odores acariciarem o meu nariz e músicas tocarem, não sei mais se são seus passos, sua voz, seu cheiro e nossas músicas.
Pode ser, na verdade, minha memória me traindo e me fazendo atribuir a você o que não era seu.
E assim, afinal, terá existido você de fato?
Terá sido real ou ilusão virtual?

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